quarta-feira, abril 23, 2003

MUITOS PROMETEM. O ANIMAL CUMPRE. (ondé k’já ouvi isto?)
Esta é uma ocasião solene em que vou escrever com seriedade. Eu sei que é problemático para a minha imagem pública, pois um bobo da corte deve dedicar-se a fazer rir a amável audiência. Mas já reparei que há uma (imensa?) minoria que pelos vistos aprecia os meus posts menos javardos. Coitados. Mas público é público e “temos de dar ao público aquilo que o público quer” (Pinto Balsemão et al.). Assim, que estes preliminares já estão longos, aqui vai:

As discussões sobre a lei dos partidos políticos, por muito interessantes e relevantes que sejam para a clarificação do regime democrático e blábláblá, deixam de fora uma outra discussão que me parece tão ou mais importante e, na minha humilde e desprezível opinião, inadiável: um fórum-debate-reflexão-ágora-whatever sobre as Ordens Profissionais.
Dou já o tiro de partida: o que é uma Ordem? Para que serve? A quem serve? Num regime democrático e num estado de direito existe um princípio constitucional sagrado que proclama a Liberdade de Associação. Então, por que carga de água pode alguém ser coagido a inscrever-se numa Organização (com as regalias inerentes, nomeadamente a de pagar as quotas)? Penso que a Liberdade de Associação não tem implícita a ideia de Associação Compulsiva. Ou terá? Dúvidas, dúvidas!...
Penso na recém-formada Ordem dos Enfermeiros, guiada por um fascínio de novos-ricos, macaqueando a Ordem dos Médicos, com um conselho disciplinar que faz dos tribunais plenários do Estado Novo uma história dos TeleTubbies (ou mesmo dos Marretas, numa visão light). A sanha persecutória é pidesca e inquisitorial. Será para ficarem bem na fotografia? Será para dar “credibilidade” a uma profissão que há apenas 30 anos era exercida por pessoal recrutado da esfregona e da lixívia, mas que agora já são todos doutores?
Outro grupinho corporativo a gemer por uma Ordem, são os designers. Cansados de arquitectos a fazer-lhes concorrência, desenhando cadeiras e logotipos, os designers sob o chapéu-de-chuva protector do CPD aspiram por uma corporação que os defenda. Mas por enquanto, o CPD não pretende proteger ninguém, excepto os amigalhaços mais íntimos. E dar graxa ao Ministro da Economia e aos gajos do ICEP, que vão passando os cheques.
E as movimentações para criar uma Ordem dos Professores? Já não terão os profes hierarquias e chefias e sistemas de controlo suficientes? Será preciso um organismo que passe certificados profissionais? Então para que serve o Estado e o sistema educativo? (boa pergunta!). O Estado e o Ministério das Universidades e Politécnicos, autorizam e homologam cursos. À saída está uma Ordem a obrigar os recém-licenciados a fazer um estágio e um exame para demonstrarem as suas competências profissionais. Nalguns casos, até é bom que assim seja, pois a qualidade dos nossos licenciados deixa muito a desejar. Mas, serão as Ordens credíveis, idóneas, cientificamente habilitadas para avaliar e/ou confirmar e/ou rejeitar um diploma emitido por uma Universidade? Quem avalia os avaliadores? Ou então, sejamos práticos: encerrem-se as universidades e os politécnicos, entregue-se às Ordens a responsabilidade (e o encargo) de formar, avaliar e aprovar profissionais licenciados para exercer um ofício. Imaginem a poupança que o governo fazia! Com esta proposta, o Primeiro-ministro dá-me uma Secretaria de Estado, no mínimo! (Estava a pensar num lugarzinho como Comissário Europeu, mas para princípio de conversa, uma Secretaria de Estado já ia dando para o tabaco).
Está aberta a polémica.
ANIMAL
As minhas desculpas ao camarote por estar a concorrer com eles em assuntos sérios. Mas acho que há espaço para ambos os debates e alguma javardeira no meio.